Por Ademar Rafael Ferreira (Papa)
Ade Maleu Lapa-el – Fale-nos sobre o filho do Piauí, Domingos Fonseca.
Papa – Domingos Martins da Fonseca, nasceu na cidade de Miguel Alves, estado do Piauí em 1913. Para muitos é um dos nomes que merecem destaque na cantoria de viola de todos os tempos. Sobre sua extrema capacidade de improvisar ouvi depoimentos de muitos cantadores.
As três sextilhas abaixo transcritas foram extraídas do trabalho acadêmico “O cantar de Domingos Fonseca a identidade negra na diáspora”, autoria de Marli Maria Veloso e Elio Ferreira de Souza, graduada e Doutor da Universidade Estadual do Piauí. É salutar quando vemos a cultura popular sendo debatida nas universidades. A décima transcrita foi improvisada por Domingos Fonseca em cantoria com Dimas Batista, retirada do livro “Obras Poéticas” do poeta de Itapetim e irmão de Lourival Batista. Percebe-se que a sensibilidade tinha ligação umbilical com a poética do piauiense, além do vasto conhecimento.
A luva que Deus atira
Nunca veio à minha mão,
E se veio desconheço
As cores dela quais são,
Se é negra vestiu minha alma
Se é branca não chegou não.
Dos meus pais não me lembro mais,
Pois sou como um arinho,
A morte roubou meus pais,
Deixou-me implume no ninho,
O primeiro voo da vida,
Quando dei já foi sozinho.
Toda mãe, por qualquer filho,
Se iguala no amor.
As mães de Cristo e de Judas,
Sofreram a mesma dor.
Uma pelo filho justo
Outra pelo pecador.
Recordo Castro Alves na versagem,
Tiradentes na sua história pública,
Lembro Deodoro na República,
E vivo Miguel Ângelo na imagem,
Imitando Oliveiros na coragem,
Ou a um Ferrabrás de Alexandria,
Comparando-me a Nero em soberbia,
E, na ciência, a Tales de Mileto,
Sou Augusto dos Anjos no soneto,
Luís Vaz de Camões na poesia.