Por Ademar Rafael Ferreira (Papa)
Ade Maleu Lapa-el – Rogaciano Leite, conte-nos sobre esse poeta e jornalista.
Papa – Rogaciano Bezerra Leite nasceu no Sítio Cacimba Nova, em Itapetim (PE), no dia 01.07.1920, sem dúvida um dos grandes poetas do Brasil. Galgou fama também como jornalista e advogado. A pandemia impediu que sua terra natal fizesse a festa do seu centenário, contudo, dentro do possível foram feitas as merecidas homenagens, inclusive com publicação de um livro e edição especial, com lapidação exclusiva para o momento. Entre seus poemas mais famosos destaco “Eulália”, “Ceará Selvagem” e “Trabalhadores”, é impossível auferir o tamanho da sua obra. Transcrevemos abaixo duas décimas do poema “Pirambu” e um dos seus encantadores sonetos “Inversão do Racismo”, retirados do livro “Carne e Alma”, obra prima da literatura brasileira.
Submundo de almas aflitas
Que estrebucham pra viver,
E vivem quase morrendo
Mas lutam pra não morrer;
Mundo infecto de palhoças
Sem privadas e sem fossas,
Sem jardim e sem quintal;
Sem um canto onde se pise
Sem que o sapato deslize
Nas fezes, no lamaçal.
***
Mundo que repugna aos olhos
Que faz mal ao coração;
Onde as crianças não têm leite
E os adultos não têm pão;
Mundo de miséria extrema,
Cujo difícil problema
O poder não encampou;
Deus não faz ponto final,
Mas chegou neste arraial,
Viu a tragédia e parou.
***
“O amor não racista…” – Ela dizia,
Quando em beijos ardentes me abrasava…
Ao seu peito, nervosa, apertava
Ao seu peito, nervoso, eu lhe prendia.
***
Era noite na praia, ninguém via
Aquele par que se beijando estava
Nos braços do cristão – ela sonhava!
E eu sonhava – nos braços da judia!
***
No templo azul daquela noite calma
Eu lhe deu uma Pátria, na minh’alma
Eu deu-me, em su’alma, a Canaã…
***
Desde então o racismo se inverteu
Vivo pensando que fiquei judeu
E ela jurando que ficou cristã!