Governo triplica pedidos à PF; maioria investiga ataques a Lula e Janja

31/01/2024 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado da primeira dama, Janja Lula da Silva, em evento no Palácio do Planalto

UOL

Os pedidos de investigação encaminhados pelo governo à Polícia Federal dispararam no terceiro mandato do presidente Lula (PT) e já representam mais que o triplo das solicitações feitas durante todo o governo de Bolsonaro (PL).

Houve 159 pedidos de abertura de inquérito feitos pelo Ministério da Justiça entre janeiro de 2023 a abril deste ano (média de 9,9 por mês). Já entre 2019 a 2022, a pasta encaminhou 44 solicitações à PF para abertura de inquéritos (média de 0,9 por mês). O levantamento foi feito pelo UOL junto ao ministério.

Maior parte dos pedidos foi feita na gestão Flávio Dino, que ficou mais tempo no comando da pasta. O hoje ministro do Supremo Tribunal Federal chefiou o ministério de janeiro de 2023 até janeiro deste ano. Do total de 159 pedidos encaminhados, 135 foram em 2023, na gestão dele — e 24 na de Ricardo Lewandowski, que assumiu em fevereiro.

Do total de pedidos feitos até o momento, 91 são suspeitas de crime contra a honra envolvendo o primeiro escalão do governo. Desses, 65 são especificamente relacionados ao presidente Lula e à primeira-dama Janja da Silva. Esse número sozinho já supera todas as solicitações do Ministério da Justiça na gestão Bolsonaro.

Pedidos de investigação de crimes contra a honra de Lula e Janja aumentaram sob Lewandowski. Em relação ao pedidos para investigar crimes contra o presidente e a primeira-dama, a maioria também se deu na gestão Dino em números absolutos: 47. Mas, na média, o maior número de pedidos ocorreu sob Lewandowski: 18 no total, ou 6 por mês.

Autoridades têm obrigação de denunciar possíveis irregularidades. Caso se deparem com suspeitas de crimes, os ministros precisam tomar alguma medida, como acionar os órgãos de controle. Do contrário, podem ser acusados de prevaricação.

Pedidos precisam ser atendidos pela PF. Quando recebe alguma solicitação do tipo do ministro da Justiça, a Polícia Federal tem que atender e abrir inquérito, ainda que na condução da investigação eventualmente ela não encontre nenhum indício de crime.

Parlamentar chamou Lula de corrupto, mas PF não apontou crime. Exemplo de como a abertura de inquérito não leva obrigatoriamente ao indiciamento ocorreu no último dia 14 de maio. A PF enviou ao STF relatório final de uma investigação solicitada por Dino em agosto de 2023 contra o deputado federal Gilvan da Federal (PL-ES), mas não recomendou denúncia.

O pedido era para apurar eventuais crimes de calúnia e difamação pelo fato de Gilvan ter chamado Lula de “ex-presidiário, ladrão, corrupto, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro” durante uma manifestação pró-armas. No relatório final encaminhado ao STF, o delegado do caso, Alessandro Silveira Furtado, se limitou a descrever o vídeo e a transcrever o depoimento do deputado, e concluiu o caso sem apontar qual crime teria sido cometido. O caso agora está sob análise da Procuradoria-Geral da República.

O alto número e a natureza dos pedidos feitos, sobretudo na gestão Dino à frente da Justiça, têm levantado debate sobre os riscos de politização da PF.

Em um dos pedidos mais recentes, que Lewandowski recebeu do então ministro da Secom, Paulo Pimenta, em 7 de maio e encaminhou para a PF, a oposição chegou a acusar o governo de “abuso de autoridade”.

Ele pediu a abertura de um inquérito para investigar políticos e influenciadores, principalmente do espectro da oposição, que estariam divulgando informações falsas envolvendo as enchentes no Rio Grande do Sul. O pedido conta com críticas à atuação do Estado e inclui até um post do deputado federal Eduardo Bolsonaro.

A sigla acusa Pimenta e Lewandowski de abuso de autoridade por tentarem supostamente criminalizar postagens que estariam contempladas pela liberdade de expressão. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, porém, não viu crime dos ministros e arquivou o pedido. Em paralelo, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou um convite para Pimenta participar de uma audiência pública no colegiado e explicar os critérios para solicitar a investigação.