Greve dos auditores da Receita pode prejudicar meta fiscal do governo, diz sindicato

A imagem mostra a fachada de um edifício da Justiça Federal do Trabalho, com um letreiro visível que diz 'Justiça Federal do Trabalho'. Duas pessoas estão descendo as escadas do prédio, que possui janelas grandes e uma estrutura de concreto. A cena é vista através de uma grade.

Folha de S.Paulo

A greve dos auditores da Receita, que completou 115 dias na última sexta-feira (21), pode impactar o cumprimento da meta fiscal do governo, afirma o Sindifisco Nacional, entidade que representa a categoria.

De acordo com o sindicato, a equipe nacional de transação de créditos tributários, responsável pela negociação de dívidas fiscais com os contribuintes, tem cerca de R$ 14,6 bilhões em negociações em fase final. Esse montante, no entanto, só deverá ser recolhido aos cofres públicos após o término da greve, segundo a entidade. O Sindifisco aponta que o valor poderia quase triplicar a arrecadação do órgão com as transações tributárias diretas, instrumento utilizado pela Receita para regularizar a situação de contribuintes.

“Muitos dos impactos são difíceis de serem dimensionados em reais, mas é evidente que a paralisação de parte importante da principal máquina arrecadatória do governo federal reflete na capacidade de obtenção de recursos e, portanto, no cumprimento das metas fiscais”, afirma a entidade. A reportagem procurou o Ministério da Fazenda, a Receita Federal e o Carf, mas os órgãos não comentaram.

A greve deve ter impacto também no Conselho istrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão istrativo responsável por julgar recursos sobre autuações da Receita em matéria tributária e aduaneira.

Segundo o sindicato, conselheiros da Fazenda Nacional estão participando das sessões de julgamento, mas deixaram de pautar processos em janeiro e em fevereiro que, juntos, somam R$ 145 bilhões.

Gisele Bossa, sócia da área tributária do Demarest e ex-conselheira do Carf, ressalta que os R$ 145 bilhões não correspondem a uma arrecadação imediata, mas sim a uma fatia do estoque de processos ainda pendentes de julgamento.

Ao todo, o Carf possui 15 câmaras de julgamento e cerca de 150 conselheiros, divididos de forma paritária entre representantes dos contribuintes e da Fazenda. No conselho, os processos são distribuídos para cada julgador de forma aleatória.

“Durante a greve, os auditores que participam do movimento deixam de pautar todos os processos a eles destinados, independente do teor da ação. É importante ressaltar que o presidente do Carf cancelou as sessões ordinárias e só está mantendo as extraordinárias”, diz o sindicato.

Gisele reforça que, apesar dos efeitos da greve no Carf, o órgão tem se empenhado para intensificar a redução de seu estoque de processos. Em 2024, o estoque caiu 18,7%, ando de R$ 1,164 trilhão para R$ 946 bilhões. No entanto, com a continuidade da greve, é provável que esse ritmo seja impactado.

Entre dezembro de 2024 e janeiro de 2025, por exemplo, o estoque voltou a subir, atingindo R$ 990 bilhões e, posteriormente, R$ 1 trilhão. A advogada afirma que paralisações da categoria, em resposta ao não atendimento de reajustes e adequações nas carreiras, têm ocorrido ao longo dos anos. Ela ressalta, assim, a necessidade de avaliar os efeitos dessas interrupções no longo prazo sobre a saúde fiscal do país.

Dão Real, presidente do Sindifisco, explica que, desde novembro, os auditores fiscais estão em greve em busca de cumprir um acordo firmado com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI), que prevê a instalação de uma mesa de negociações para discutir o reajuste do vencimento básico dos auditores fiscais para os anos de 2025 e 2026.

“Estamos há um trimestre parados e isso fatalmente vai produzir efeitos no futuro”, afirma.

Em nota, o MGI informa que um acordo com as entidades foi firmado em fevereiro de 2024, por meio de uma mesa de negociação específica e temporária, que abordou a regulamentação do bônus e o reajuste da remuneração para os servidores já em 2024.

“Na negociação, acatou-se a proposta da categoria pela regulamentação do bônus. O reajuste do teto do bônus resultou em um aumento nos ganhos mensais dos auditores fiscais compatível com as atribuições e a complexidade da carreira, e respeitando o limite orçamentário para os reajustes, podendo alcançar R$ 41,26 mil, em fevereiro de 2026, para servidores no ‘topo’ da carreira [vencimento mais bônus]”, diz o MGI.

O ministério diz também que, mesmo após o acordo, continuou em diálogo com o Sindireceita e o Sindifisco Nacional, que foram recebidos em mais quatro reuniões entre agosto e novembro de 2024. “Dado que o acordo já foi alcançado em 2024, não há previsão de novas negociações com a categoria”, afirma o MGI.