Refém do Centrão, Lula é obrigado a engolir sapos em série

O presidente Lula sanciona projetos de proteção às mulheres no Planalto

Por Bernardo Mello Franco/O Globo

Em 1989, Leonel Brizola ficou fora da corrida ao Planalto por 0,6% dos votos. Depois de uma semana de suspense, anunciou apoio ao PT no segundo turno. “Um velho político do Rio Grande do Sul, o senador Pinheiro Machado, dizia que a política é a arte de engolir sapos. Não seria fascinante fazer essas elites engolirem o Lula, o sapo barbudo?”, justificou.

No terceiro mandato presidencial, o petista já foi obrigado a deglutir sapos de diferentes tamanhos. Nesta semana, teve que ingerir um dos maiores. Após anunciar seu novo ministro das Comunicações, viu o escolhido desistir do cargo para permanecer na Câmara.

O deputado Pedro Lucas Fernandes aceitou o convite, mas disse que precisava resolver algumas “questões pessoais” antes de tomar posse. Depois de enrolar o Planalto por 12 dias, alegou que poderia “contribuir mais com o país” na Câmara. É mais fácil acreditar no coelhinho da Páscoa do que no patriotismo do líder do União Brasil.

O episódio submeteu Lula a uma dupla humilhação: expôs o amadorismo de sua articulação política e a debilidade de sua base parlamentar. Mesmo irritado com a recusa, o presidente teve que engolir um novo batráquio. Deixou o União Brasil indicar outro ministro para a pasta que esnobou.

Apesar de comandar três ministérios, o partido se alinha mais à oposição do que ao governo. De seus 59 deputados, 40 apoiaram a urgência do projeto que dá anistia aos golpistas. Um velho parlamentar do União define a relação da sigla com Lula como um “casamento aberto”. Pode ser, mas só um dos lados parece ter licença para trair.

Além de constranger o presidente, o refugo de Pedro Lucas mostra como a balança do poder se inverteu. Até a invenção do orçamento secreto, todo parlamentar sonhava em virar ministro. Hoje é mais negócio continuar no Congresso, ainda que no baixo clero. Cada deputado tem direito a R$ 37 milhões em emendas impositivas por ano, sem contar as emendas de bancada e as de comissão.

Lula tentou acabar com esse sistema, mas fracassou. Ontem teve que correr para empossar um novo ministro — antes que ele resolvesse mudar de ideia.