Por Geraldo Eugênio*
A região do Pajeú em que se encontra Serra Talhada foi uma área de expressiva ação vulcânica. A cidade de Serra Talhada, por exemplo é rodeada por serras deixando claro que há milhões de anos deveria ter sido uma cratera. Quem se desloca para Floresta, um pouco antes da entrada do distrito de São Miguel, sai desta bacia de serras em uma fenda enviesada entre dois montes rochosos. Durante o retorno este cenário ainda mais claro. Ao fundo a serra que dá o nome à cidade e o vale que se segue por aproximadamente 25 quilômetros deixando claro que este ´buraco` foi sendo preenchido pelo efeito da intemperização das rochas que o circundava.
Geologia à parte, em conversas recentes com o Prof. Miguel Leonardo, ele chamou a atenção para a importância de se continuar discutindo o papel de uma espécie florestal exótica introduzida no semiárido brasileiro, a Algaroba. Planta da família Fabacea, antiga Leguminosae. Acatei a sugestão por várias razões discutidas a seguir neste texto. A espécie comumente cultivada ou presente na região Sertão e Agreste tem o nome científico de Prosopis juliflora. Este gênero conta com um número elevado de espécies que originalmente ocorre entre o Sudoeste dos Estados Unidos até a Patagônia.
Uma coisa é certa, a primeira introdução da planta se deu na Estação Experimental do IPA, Fazenda Saco, no município de Serra Talhada, em 1942 tendo três personagens importantes neste intento, o Prof. J. B. Griffing, então diretor da Escola de Agronomia de Viçosa, MG enviou sementes para o Engenheiro Agrônomo do IPA, Clodomiro Albuquerque. Esse material ficou sob a responsabilidade do Eng. Agrônomo Lauro Bezerra que ficou sob a responsabilidade da produção e distribuição das mudas.
A planta número um ainda se encontra em frente ao escritório do IPA na Estação Experimental de Serra Talhada, havendo há poucos anos quase sido abatida por uma poda extrema que impam à árvore. Coisa de que não está afeito ao manejo de espécies arbóreas e que tem pouca afeição pela história. Ainda bem que foi salva e hoje é o registro vivo do que foi este fato relevante para o Semiárido.
Expansão das áreas de algarobeira
Após a introdução e deparando-se com os ciclos frequentes de secas os governos estaduais da região Nordeste e o governo federal empreenderam vários programas de disseminação da algaroba, lembrando em especial aqueles realizados no âmbito da Sudene. No estado de Pernambuco, é bom lembrar que quando governador o Roberto Magalhães, coincidentemente um serra-talhadense, o Secretário de Agricultura, José Inácio, político da região Agreste do estado, teve como principal programa a produção e distribuição de centenas de milhares de plântulas de algaroba.
Seu fervor era tão intenso à causa que ou a ser conhecido como Zé Algaroba. Foi neste momento que o Secretário José Inácio solicitou os préstimos de um outro grande técnico, paraibano radicado em Pernambuco, o Prof. Mário Antonino para, com ele, dirigir no âmbito do Brasil a International Prosopis Association – IPA.
O esforço governamental e em particular desses dois senhores, contando com o auxílio da FAO, da ONU e da consultoria de renomados pesquisadores como o Prof. Peter Felker, então pesquisador da Texas A&M University, em Kingsville, Texas.
O uso extensivo da caatinga para lenha e carvão
À medida que se dava a expansão das áreas cultivadas ou ocupadas pela algaroba de forma natural através da disseminação por animais herbívoros e pássaros que tinham em suas vagens e sementes uma fonte proteica, formatou-se uma grande polêmica sobre os riscos que aquela planta exótica estaria causando ao meio ambiente da região Nordeste. A bibliografia sobre o assunto é enorme. Há muitos artigos, capítulos, relatórios e trabalhos científicos sobre os aspectos positivos do cultivo da Algaroba, mas, sem dúvida o número de registros, em especial durante as décadas de 90 e a primeira década do século XXI são bem mais abundantes.
Quando de sua introdução a algaroba era tida como uma forragem salvadora dos rebanhos durante os períodos de estiagem. Durante as secas quase todo o pasto desaparecia, restando as vagens de algaroba como um alimento de elevado teor proteico, o que ocorreu durante anos. Em complemento à polêmica sobre sua agressividade na ocupação de áreas de aluvião e áreas desmatadas, foi acrescido o fato de que o consumo intensivo do farelo preparado à base do fruto da algaroba causava paralisia facial nos bovinos, conhecida popularmente como cara-torta.
Quanto à agressividade em se adaptar e multiplicar-se este é um fato inconteste, entretanto não conheço áreas em que a caatinga, naturalmente, haja sido substituída pela algaroba. Os grandes maciços de algaroba são resultados do plantio ou da ocupação em áreas antropizadas. Um outro aspecto interessante, tal qual se deu com a palma forrageira, é o fato de se esclarecer que esta planta e seus coprodutos não poderia ser usada como ração sem o complemento de outras espécies, em especial os volumosos à base de gramíneas. O uso inadequado é objeto de intoxicação por qualquer espécies e não apenas pela algaroba.
Os financiamentos desapareceram, ficando a algaroba e os questionamentos sobre o acerto ou não daqueles que por ela trabalharam.
A algaroba como uma opção energética
Concomitante às secas, não foi difícil se observar que a caatinga estava sendo consumida em escala elevada e que a demanda por lenha nos fornos das indústrias de gesso, no Araripe, a atividade cerâmica, as empresas de alimentos e o consumo doméstico levavam a um desmatamento sem controle da vegetação nativa. Aí entra o tronco e galhos da algaroba como o substituto quase que perfeito como opção energética. A Algaroba deixou se ser vista apenas como mais uma espécie forrageira para ser tida como uma insubstituível fonte de calorias à indústria demandante por calor e quanto ao uso como estaca e mourão na formação e recuperação de cercas.
Parece hilário mas o fato é que as áreas com algaroba aram a ser senão o único, mas a mais importante defesa da caatinga, juntamente com a apicultura. Diariamente nas rodovias e estradas do Agreste e Sertão de Pernambuco são centenas de caminhões carregados de lenha e estacas. Imaginando-se que cada uma dessas cargas representa um volume equivalente de espécies da caatinga que estariam indo aos fornos e cercas, não é difícil de se concluir que o saldo da introdução, sem se considerar nenhum tom laudatório, é extremamente positivo. Sua exploração como energia e material de cerca e construção ou a ser uma forte atividade econômica para a região e assegurou que segmentos como o do gesso não entrassem em colapso.
Foi introduzida como a salvação dos rebanhos e oito décadas depois se tornou uma matéria prima energética estratégica para a região e para o meio ambiente. Obrigado à visão estratégica do Prof. J. B. Griffing e aos esforços dos Engenheiros Agrônomos Clodomiro Albuquerque e Lauro Bezerra por haverem cuidado e tornado plântulas e árvores as 32 sementes que sabiamente foram ao IPA enviadas.
*Geraldo Eugênio é Professor Titular da UFRPE-UAST.