Por Fernando Castilho/JC
Nos últimos anos, quando o Congresso Nacional decidiu apoderar-se de nacos do orçamento federal, aproveitando-se da fragilidade política dos presidentes, o Brasil assistiu a um deslocamento de recursos que em cinco anos (2020 e 2024) permitiram que senadores de deputados comandassem o destino de nada menos que R$ 102,97 bilhões pagos pelo Tesouro Nacional a mais 5.571 municípios onde eles são votados.
Eles destinaram R$ 176,59 bilhões. Mas dificuldades burocráticas em boa parte dos receptores em cumprir minimamente as exigências de documentação fizeram R$ 73,62 bilhões deixar de serem pagos.
Entretanto, uma consulta sobre como suas excelências vem destinando os recursos desmonta o argumento de que por conhecerem as dificuldades da realidade dos municípios onde são votados ajudaria a que destinaram verbas para elevar a melhoria dos investimentos nas suas bases.
Eles aumentaram o volume de emendas destinadas, mas depois de cinco anos não há qualquer indicação que os menores municípios melhoraram sua situação em função do dinheiro que aram a receber.
Como a legislação obriga a que metade dos recursos das emendas devem ser aplicados na saúde, o destino em cinco anos de R$ 51,48 bilhões poderia significar um salto de investimentos nessa área.
Só que uma busca simples no site da Secretaria do Tesouro Nacional e no Portal da Transparência revela que o dinheiro das emendas acabou no custeio mensal dos municípios, especialmente os menores.
Os dados do Portal da Transparência mostram que, entre 2020 (quando foram pagos R$ 17,63 bilhões ano que ou para a história como o início do orçamento secreto), e 2024 quando o governo Lula incorporou definitivamente o pagamento como instrumento de aprovação de seus projetos no Congresso os valores pagos, às emendas subiram para R$ 31,39 bilhões.
O que chama a atenção é a evolução do pagamento de emendas com destinação definida (R$ 4,78 bilhões em 2020) para R$ 12,18 bilhões em 2024. Mas, elas nem se comparam ao pagamento de emendas especiais (as chamadas emendas PIX) que aram de módicos R$ 612,2 milhões, em 2020, para R$ 7,68 bilhões pagos integralmente ao que foram orçadas para o exercício.
Isso quer dizer que os deputados e senadores puderam comandar sem que os órgãos de controle soubessem o destino de quase R$8 bilhões alavancando sua influência nas cidades. E que o estado pagou no exercício tudo o que eles listaram.
Como a distribuição dos recursos não está, por exemplo, vinculada ao tamanho da participação do estado na federação, naturalmente, ter força junto ao relator do Orçamento Geral da União acaba sendo um fator determinante da hora de mandar o dinheiro.
Em 2021, em plena pandemia, os quatro estados mais novos da nossa Federação e de menor população do Brasil (Roraima, Amapá, Rondônia e Acre) receberam recursos de emenda individuais de R$ 458,73 milhões além dos R$ 227,16 milhões das emendas especiais.
Isso quer dizer que a população somada deles, em 2022, (4,133 milhões de habitantes) recebeu R$ 685,89 milhões, bem mais que a população de Minas Gerais, com 21,3 milhões de habitantes e que recebeu R$ 602, milhões. Talvez já pela influência do atual presidente do Congresso, Davi Alcolumbre que, ano ado, destinou R$114 milhões para sua querida Macapá.
Em 2022, quando o presidente da Câmara, Arthur Lira, foi reeleito para um mandato de mais dois anos, sua querida Alagoas foi agraciada com R$ 1.131,4 bilhão dos quais R$ 682,4 milhões classificados como emendas de relator.
Ano ado, Alagoas recebeu R$ 1.466,1 bilhão, dos quais R$ 618,0 milhões como emenda de bancada mostrando como a mesa diretora da Câmara Federal pode ajudar. Naquele ano, a maioria dos municípios de Alagoas recebeu valores entre R$ 29,69 milhões e R$106,28 milhões.
A distribuição aleatória, ou de acordo com os interesses paroquiais dos deputados e senadores, mostra que o poder de destinar grandes blocos de recursos do orçamento público não significa que eles terão visibilidade.
Nos últimos cinco anos (2020-2024), o Nordeste com seus nove estados recebeu, apenas de emendas, R$ 21,96 bilhões. Entretanto, a pulverização da distribuição e, mais recentemente a possibilidade do uso das emenda PIX, dificulta qualquer resultado mais perceptível.
Os dez municípios mais pobres de Pernambuco Itacuruba, Ingazeira, Solidão, Calumbi, Terezinha, Granito, Brejinho, Vertente do Lério, Itapetim e Quixaba, por exemplo, receberam juntos R$132,6 milhões entre 2020 e 2024.
Desse total, R$ 119,5 milhões de emendas individuais. Mas apenas R$ 13,0 milhões, via emendas de bancadas. O que aponta que eles tem algum deputado federal interessado na sua população, mas que não tem interesse em projetos mais robustos.
E uma leitura dos dados disponíveis no portal da STN revela que, mesmo as verbas classificadas como despesas de capital, que poderiam indicar investimentos, em sua maioria estão destinadas a pagamentos de despesas dos fundos municipais de saúde, E a outra metade que está na rubrica de despesas correntes também foi paga como custeio.
Os números desses municípios mostram que em sua maioria as emendas foram destinadas ao pagamento de pessoal da secretaria de saúde sem indicar que essas cidades usaram os recursos para melhorar a vida de suas populações como coisas duradouras.
Porém, o comportamento dos deputados muda radicalmente quando se trata das grandes cidades. Recife, Jaboatão dos Guararapes, Petrolina, Caruaru e Olinda receberam juntas (entre 2020 e 2024) quase meio bilhão de reais (R$ 430,3 milhões),
Nesse período, o Recife foi agraciado com R$183,4 milhões, dos quais R$ 74,6 milhões graças a emendas de bancada, o que revela uma enorme capacidade de articulação do prefeito, João Campos.
Mas o que chama atenção é como eles despertam o interesse dos deputados em destinar verba como emendas de bancada que podem agrupar mais recursos. Esse grupo, em cinco anos, soma R$108,6 milhões para essas cinco cidades em projetos que podem de fato dar visibilidade.
Claro que a bancada de Pernambuco não deixou de indicar R$ 351,7 milhões para suas bases nas outras cidades. Mas isso apenas mostra falta de certeiros que eles poderiam usar em municípios mais pobres e têm demandas urgentes e muito mais baratas e que poderiam resultar em impactos mais duradouros que apenas pagar a conta das despesas correntes dessas comunidades.