Estadão
No começo deste ano, a professora aposentada Marly Santinato Lombardi, de 80 anos, tomou conhecimento, por notícias antigas, da existência de descontos ilegais nos pagamentos do INSS. Moradora de Jundiaí (SP) e aposentada pelo INSS desde 2006, resolveu descobrir se a fraude acontecia no seu caso.
Sem receber os extratos dos pagamentos, pediu informações para a filha sobre como poderia checar se era uma das vítimas. Buscou ar o aplicativo, sem sucesso, devido às diversas etapas necessárias para cadastrar informações, documentos e fotografia. “Para os mais idosos, é mais difícil usar esses aplicativos”, afirma.
Depois de mais uma tentativa para ar o aplicativo, desta vez com a ajuda da filha, constatou estar tendo descontos realizados pela associação privada Master Prev desde setembro do ano ado. “Os valores foram aumentando, começaram em torno de R$ 60 por mês, e chegaram a R$ 81″, diz.
Cancelar os descontos não foi uma tarefa simples. Marly tentou contato pelo número de atendimento do INSS, mas enfrentou longas esperas: “sempre havia uma fila de mais de 40 minutos na linha”, contou. Depois, conseguiu o telefone da Master Prev e solicitou a desfiliação.
Dias depois, recebeu em casa um documento para para declarar que desejava cancelar a filiação à Master Prev. “Como eu nunca pedi para ser filiada, eu nem respondi e não assinei”, diz Marly, que considerou que o documento buscava dar ares de legalidade aos descontos anteriores. Precisou voltar ao aplicativo do INSS para garantir o descadastramento.
Até março, os descontos ainda foram feitos. Só a partir de agora, segundo o atual extrato, é que voltará a receber os seus benefícios integralmente. “É um absurdo fazerem esses descontos dos aposentados. É dinheiro que poderia ser usado para comprar remédios”, diz.
Poucos dias após conseguir resolver o problema, Marly soube que a Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) realizaram, na quarta-feira, 23, operação de buscas e apreensões no Distrito Federal e em 13 Estados. Batizada de Operação Sem Desconto, a ação derrubou o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, e colocou sob suspeita 11 entidades.
Segundo a apuração da PF, elas participariam de um esquema que descontava mensalidades sem o conhecimento de aposentados e pensionistas ou que eles pensavam ser obrigatórias.
A Master Prev, que fez os descontos indevidos na aposentadoria de Marly, não é uma das 11 entidades alvo de medidas judiciais da Operação Sem Desconto. Mas ela é citada entre as organizações que tinham Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com o INSS, e se coloca entre as 10 que mais fizeram descontos em 2024. Também foi mencionada como responsável por descontos feitos sem consentimento por outros aposentados ouvidos pela reportagem.