Mudança nas datas da Copa do Brasil prova que CBF e clubes colocam conveniências acima do coletivo

Taça da Copa do Brasil de 2023, disputada por Flamengo e São Paulo

Toda vez que se mexe no calendário para mudar datas aqui e ali, a fim de adequar competições aos interesses de alguns, teima-se em olhar para as árvores, mas não enxergar o bosque. Discute-se por tempo demais o jogo da próxima quarta, que deveria ser no domingo, mas agora mudou, e por isso o técnico terá tal jogador, que estaria com a seleção, etc e tal. Sem que se trate diretamente do problema e de como resolver o malfadado sistema, só se fala das árvores.

A inversão de datas da Copa do Brasil com o Brasileiro, que a CBF “corajosamente” anunciou às 21h de sábado, para ter a menor repercussão possível com sua nota, atende aos interesses de apenas dois clubes: Flamengo e Atlético-MG. Esses times seriam desfalcados por jogadores que estariam jogando por suas seleções na Data Fifa de 15 de outubro. A entidade justificou na nota que a mudança permitirá que “empreguem força máxima” na Copa.

Curiosas as palavras escolhidas pela CBF. Pois se o calendário é alterado a duas semanas das partidas para sobrepor a Copa ao Brasileiro, a confederação acaba de decidir que um torneio é, por algum motivo, mais importante que o outro. Mais: a entidade determinou que a performance com “força máxima” de Flamengo e Atlético-MG na Copa é mais relevante que as campanhas de Corinthians, Vasco e Fluminense, entre outros prejudicados, no Brasileiro.

Sem querer complicar o que já é complexo, a questão também é comercial. A Copa do Brasil é uma competição negociada pela CBF, que fica com um percentual da receita de seus direitos de transmissão e patrocínios para ela. O Brasileiro pertence aos clubes, ainda que eles estejam rachados entre Libra e LFU. O Flamengo pode não querer mais jogar o Brasileirão deste ano, pois desperdiçou a chance de vencê-lo. Não deveria ter o direito de desvalorizá-lo. Nem a CBF.

Só não nos deixemos iludir ao contar duas ou três árvores. Enxerguemos o bosque. Se hoje a divergência coloca as competições nacionais uma contra a outra, e até ambas contra a Data Fifa e as seleções, isto só ocorre por causa do excesso de jogos. Setembro, outubro e novembro são espremidos, entre seus principais torneios, porque fevereiro, março e abril foram gastos por Estaduais com estádios vazios, baixa audiência e relevância esportiva mínima.

A solução está ao alcance. Calendário de Série A não deveria ser feito pela confederação, mas pela liga de clubes, com a chancela da entidade. A racionalização das datas faria com que essas situações, times desfalcados antes de confrontos decisivos por Datas Fifa, ou o que for, fossem evitadas. E, se elas ainda ocorressem, mudanças seriam decididas por maioria, em comitê técnico e votação, não por influência política e ingerência do cartola da confederação.

O que ainda impede o futebol brasileiro de chegar lá, fora a intrincada trama da liga, é a conveniência momentânea acima do benefício coletivo. O Atlético-MG se vê como adversário letal e histórico do Flamengo, mas não viu problema em calar e se beneficiar da alteração de datas que o rival reivindicou. O Flamengo diz querer a liga, porém jogou contra o Brasileiro dos outros para melhorar suas chances na Copa. É assim que o bosque se mantém do jeito que está.